Nas últimas semanas, o mundo viu a busca por uma vacina contra o SARS-CoV-2, vírus causador da Covid-19, acelerar-se em tempo recorde. Relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), publicado no último dia 2 de junho, reúne 133 pesquisas de imunizantes contra o novo coronavírus. Os Estados Unidos lideram a lista, com 42 projetos, seguidos por 19 da China — que reúne cinco das dez iniciativas já em testes clínicos, em seres humanos.
Se geralmente as vacinas levam uma década para serem desenvolvidas, a pandemia de um vírus altamente contagioso, que em cinco meses matou mais de 400 mil pessoas no mundo, tem mobilizado altos investimentos e equipes, que chegam a falar em uma fórmula ainda para este ano — apesar de mesmo os mais otimistas considerarem quase impossível haver uma vacina segura e eficaz antes de 2021, sobretudo diante da necessidade de bilhões de doses. Mesmo com o momento emergencial, há um rigor mínimo necessário para garantir a segurança e comprovar a eficácia da vacina para um amplo grupo de pessoas, que precisam produzir suficientes anticorpos neutralizantes do vírus de forma prolongada.
Apesar de EUA e China terem mais projetos, a vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford, no Reino Unido, é a mais avançada, na fase três de testes clínicos (depois dela ainda são necessários testes em larga escala para a aprovação regulatória), com 10.260 voluntários. Como o Brasil ainda vive o auge da pandemia, serão testadas no país duas mil pessoas que estejam mais expostas ao vírus, como profissionais de saúde, no Rio de Janeiro e em São Paulo. No Rio, os testes serão conduzidos pelo Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino e pela Rede D’Or, que cobrirá custos da primeira parte de estudos; já o Centro de Referência para Imunobiológicos Especiais (Crie) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) coordenará os testes na cidade, com financiamento da Fundação Lemann.
Parcerias com empresas são chave para garantir a fabricação de vacinas em larga escala, por isso a Morgan Stanley incluiu entre os projetos mais promissores alguns que ainda não estão em testes clínicos, mas têm alto potencial de produção. No entanto, teme-se que os interesses comerciais prevaleçam e países menos desenvolvidos fiquem atrás na distribuição vacinal — como o Brasil, já excluído de aliança internacional coordenada pela OMS para incentivar a produção de uma vacina. Em meio à disputa por patentes, a China anunciou que, se qualquer um de seus projetos for bem-sucedido, transformará a tecnologia para a produção da vacina em bem público global.
Projetos promissores pelo mundo
Sanofi/GSK
As duas empresas se uniram para desenvolver uma vacina que prevê testes em seres humanos no segundo semestre deste ano, podendo originar uma vacina no segundo semestre de 2021. A Sanofi entra com a tecnologia de DNA recombinante, que cria uma correspondência genética com as proteínas encontradas na superfície do coronavírus. Já a GSK contribui com um adjuvante, substância adicionada a algumas vacinas para melhorar a resposta imune — ele pode diminuir a quantidade de proteína necessária por dose, permitindo que a vacina seja produzida em larga escala, o que é fundamental numa pandemia. A combinação de um antígeno à base de proteínas e um adjuvante é utilizada em várias vacinas disponíveis atualmente.
Oxford/AstraZeneca
Desenvolvida pela Universidade de Oxford, na Inglaterra, a vacina usa uma versão modificada de um adenovírus de chimpanzé, incapaz de infectar humanos, para levar às nossas células material genético que codifica a proteína spike, responsável pela multiplicação do SARS-CoV-2. O sistema imune reage como se estivesse sendo invadido pelo coronavírus, produzindo anticorpos. Os testes terão 10.260 voluntários na segunda fase — que testará pessoas acima de 55 anos e crianças entre 5 e 12 anos — e na terceira, que incluirá dois mil voluntários no Brasil: mil no Rio de Janeiro, com coordenação do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino e da Rede D’Or, que entrará com financiamento; e mil em São Paulo, com estudos liderados pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e financiamento da Fundação Lemann. A farmacêutica AstraZeneca se associou à pesquisa e já assinou com Reino Unido e EUA para produzir a vacina em escala industrial.
Johnson & Johnson
Assim como a vacina de Oxford, a empresa usa um adenovírus para “enganar” o sistema imune, que produz anticorpos como se estivesse sendo infectado pelo Sars-CoV-2. Os testes pré-clínicos foram realizados com macacos resos, também usados nos projetos de Oxford e Sinovac. Os testes clínicos só começam em setembro, mas o projeto entrou numa lista da Morgan Stanley pelo potencial de distribuição: a empresa prevê a produção de 600 a 900 milhões de doses da vacina no primeiro trimestre do ano que vem e um bilhão até o fim de 2021.
Moderna/National Institutes of Health (NIH)
A tecnologia usa a sequência genética de uma molécula de RNA para codificar a proteína do vírus, sendo inserida em nossas células. Estas, por sua vez, reproduzem a proteína do vírus, estimulando o sistema imune. Apesar de ser uma técnica versátil, por não manipular o vírus, não há nenhuma vacina no mundo produzida dessa forma. Ainda que a empresa tenha publicizado grandes resultados, eles se referiam à imunização de apenas oito pessoas. A empresa foi autorizada a pular etapas pela Food and Drug Administration (FDA), agência reguladora dos EUA. Em acordo com a farmacêutica Lonza, a Moderna diz que poderá produzir um bilhão de doses da vacina em meados de 2021.
Sinovac Biotech
A farmacêutica começou o projeto já em janeiro, em parceria com instituições acadêmicas da China, e publicou na “Science” os resultados dos estudos pré-clínicos, com eficácia em macacos resos, passando para os testes em humanos. A empresa espera produzir 100 milhões de doses anuais. A pesquisa usa a técnica do vírus inativado, a mesma de outros três projetos na China que também já estão em fase de testes clínicos.
CanSino Biologics 1/Instituto de Biotecnologia de Pequim
Batizada de Ad5-nCoV, a vacina usa um adenovírus com o objetivo de fornecer antígenos que estimulam a resposta imune do organismo. A Ad5-nCoV foi testada em 500 pacientes até o fim de abril e está na segunda fase de testes clínicos desde maio. Segundo o relatório, é esperado que a terceira fase inclua outros países além da China. A companhia pretende produzir 100 milhões de doses em 2021.
BioNTech/Pfizer
Desde 2018, a alemã BioNTech e a americana Pfizer têm uma parceria para a produção de vacinas contra a influenza. Agora elas se juntam em pesquisa contra a Covid-19, que usa a tecnologia do RNA mensageiro em três formatos diferentes, combinada a dois antígenos. Os testes clínicos são nos EUA, na Alemanha e na China, onde há uma parceria com Fosun Pharma. A capacidade de produção estimada de centenas de milhões de doses em 2021. Outra empresa alemã que desenvolve vacina com RNA é a CureVac.
FONTE: R7